Uma plataforma que vai te ajudar a entender um pouco mais de economia.

O Brasil já teve megainflação, sintoma de uma megalomania de desfuncionalidade. O período de inflação altíssima, porém, encontrou seu fim com o Plano Real. Desde então, temos inflação moderada, às vezes incômoda, mas nunca mais tivemos que correr ao supermercado no dia do pagamento. Vencemos uma das mazelas que nos afligiam.

Mas outra mazela continua em plena forma —dizem até que correu a maratona vestindo botas e nem feriu o dedão do pé. É a criminalidade, que age com sua irmã siamesa, a violência.

Já tivemos o conforto de viver sem as preocupações de sequestros relâmpagos. Muitos brasileiros da geração que se aproxima dos 50 anos passaram a adolescência em capitais do Brasil, do Norte ao Sul, sem se preocupar com crime. Uma realidade que inexiste agora, em especial nas violentíssimas capitais do Nordeste e também em cidades médias Brasil afora.

Nenhum setor de nossa economia deve ter crescido tanto quanto a bandidagem. Nenhuma atividade vicejou tanto quanto o crime.

Infelizmente, não teremos para o crime a bala de prata do Plano Real. Não tem engenharia financeira que resolva o problema. A alta taxa de criminalidade representa aquilo que economistas chamam de "equilíbrio estável". E essa é natureza do problema, que merece uma explicação.

Os crimes contra a propriedade são motivados por considerações econômicas, mas sobre um pano de fundo sociológico e moral. Vale a pena pensarmos nas considerações econômicas separadamente. Então vamos imaginar um sujeito completamente amoral, que toma decisões apenas comparando seus ganhos e perdas esperadas.

Vamos chamá-lo de Amoraldo.

Nosso amigo Amoraldo acorda de manhã e decide: vou trabalhar ou vou roubar? Se decidir trabalhar, receberá um salário e voltar para a casa no fim do dia sem complicações com a lei. Se decidir roubar, vai receber o produto de sua ladroagem e, ao final do dia, voltará para casa ou dormirá na cadeia, dependendo da eficácia da polícia.

Pesando as duas alternativas na balança, roubar se tornará relativamente mais atraente quando o produto do roubo for maior (por exemplo, quando há ricos por perto), quando a atividade dentro da lei for mal paga (por exemplo, quando Amoraldo não consegue obter um bom emprego porque não sabe ler ou tem uma tatuagem de caveira na testa), e quando a polícia for pouco efetiva e, portanto, a probabilidade de ir para o xilindró for menor.

Agora imaginemos que Amoraldo não está sozinho. Outros indivíduos amorais estão fazendo o mesmo cálculo toda manhã. Aparece, então, um novo fator na decisão: quantos outros decidiram sair para roubar. Se há muitos ladrões, vai faltar policial para capturá-los (imagine você tomando conta de três sobrinhos ao mesmo tempo) e cada bandido vai ter uma probabilidade menor de ser pego. Se Amoraldo sabe que os irmãos Metralha e João Bafo de Onça estão à solta e apavorando, sua atividade criminosa tem uma probabilidade maior de ser bem-sucedida.

Existem, assim, dois possíveis equilíbrios.

Em um equilíbrio, os bandidos em potencial acham que estão sozinhos no crime, logo, roubar se torna perigoso e eles decidem bater ponto num trabalho honesto. É o equilíbrio bom.

No outro equilíbrio, os bandidos estão "motivados" para arrepiar e confiantes em que não serão pegos. Para eles, a polícia é como a defesa do Brasil contra a Alemanha no Mineirão. É o equilíbrio ruim.

A questão é: como o mundo seleciona o equilíbrio? Aqui entram vários fatores, inclusive não econômicos.

A História importa. Se ontem o crime não compensou, é provável que não compense hoje e amanhã. Cidades que têm sido seguras tendem a continuar seguras, salvo na ocorrência de algum fato novo que desestabilize o equilíbrio.

Crenças morais também importam. Não somos tão simples quanto o Amoraldo, que busca apenas ganhar mais dinheiro, não importa como. Trazemos nossas visões de mundo, que aprendemos na igreja ou no colo da avó, sobre o que é certo e errado. Os valores da sociedade também importam: onde quem ganha dinheiro honestamente é respeitado, menos vai compensar ser bandido. E se menos Amoraldos decidirem ser bandidos, menos bem-sucedidos eles serão! E sendo menos bem-sucedidos, também os bandidos são mais repulsivos aos valores da sociedade.

Daí o nosso problema. Desde que o Brasil deixou a criminalidade aumentar, os benefícios da ladroagem também aumentaram. Com mais bandidos na rua, o sentimento de impunidade se avulta. Impunes, bandidos bem-sucedidos dirigindo automóveis vistosos e jantando em restaurantes caros corrompem os valores da sociedade.

Voltar para o equilíbrio bom exige, dessa forma, uma grande mudança nas condições. Um pouco mais de policiais na rua ou empregos um pouco melhores na economia honesta não vão ser suficientes.

Precisamos de tudo junto agora: mais policiais para aumentar a probabilidade de cana, penas mais duras para a cana ser mais dolorosa, mudança nos valores da sociedade para que o bandido bem-sucedido se torne um pária e não possa usufruir de seus ganhos e, para completar, uma mudança nas percepções sobre as possibilidade de sucesso de atividade criminosas, para que mesmo um sujeito ruim como o Amoraldo pense duas vezes antes de sair da linha.

Por que é tão difícil reduzir a criminalidade?

O Brasil já teve megainflação, sintoma de uma megalomania de desfuncionalidade. O período de inflação altíssima, porém, encontrou seu fim com o Plano Real. Desde então, temos inflação moderada, às vezes incômoda, mas nunca mais tivemos que correr ao supermercado no dia do pagamento. Vencemos uma das mazelas que nos afligiam.

Mas outra mazela continua em plena forma —dizem até que correu a maratona vestindo botas e nem feriu o dedão do pé. É a criminalidade, que age com sua irmã siamesa, a violência.

Já tivemos o conforto de viver sem as preocupações de sequestros relâmpagos. Muitos brasileiros da geração que se aproxima dos 50 anos passaram a adolescência em capitais do Brasil, do Norte ao Sul, sem se preocupar com crime. Uma realidade que inexiste agora, em especial nas violentíssimas capitais do Nordeste e também em cidades médias Brasil afora.

Nenhum setor de nossa economia deve ter crescido tanto quanto a bandidagem. Nenhuma atividade vicejou tanto quanto o crime.

Infelizmente, não teremos para o crime a bala de prata do Plano Real. Não tem engenharia financeira que resolva o problema. A alta taxa de criminalidade representa aquilo que economistas chamam de "equilíbrio estável". E essa é natureza do problema, que merece uma explicação.

Os crimes contra a propriedade são motivados por considerações econômicas, mas sobre um pano de fundo sociológico e moral. Vale a pena pensarmos nas considerações econômicas separadamente. Então vamos imaginar um sujeito completamente amoral, que toma decisões apenas comparando seus ganhos e perdas esperadas.

Vamos chamá-lo de Amoraldo.

Nosso amigo Amoraldo acorda de manhã e decide: vou trabalhar ou vou roubar? Se decidir trabalhar, receberá um salário e voltar para a casa no fim do dia sem complicações com a lei. Se decidir roubar, vai receber o produto de sua ladroagem e, ao final do dia, voltará para casa ou dormirá na cadeia, dependendo da eficácia da polícia.

Pesando as duas alternativas na balança, roubar se tornará relativamente mais atraente quando o produto do roubo for maior (por exemplo, quando há ricos por perto), quando a atividade dentro da lei for mal paga (por exemplo, quando Amoraldo não consegue obter um bom emprego porque não sabe ler ou tem uma tatuagem de caveira na testa), e quando a polícia for pouco efetiva e, portanto, a probabilidade de ir para o xilindró for menor.

Agora imaginemos que Amoraldo não está sozinho. Outros indivíduos amorais estão fazendo o mesmo cálculo toda manhã. Aparece, então, um novo fator na decisão: quantos outros decidiram sair para roubar. Se há muitos ladrões, vai faltar policial para capturá-los (imagine você tomando conta de três sobrinhos ao mesmo tempo) e cada bandido vai ter uma probabilidade menor de ser pego. Se Amoraldo sabe que os irmãos Metralha e João Bafo de Onça estão à solta e apavorando, sua atividade criminosa tem uma probabilidade maior de ser bem-sucedida.

Existem, assim, dois possíveis equilíbrios.

Em um equilíbrio, os bandidos em potencial acham que estão sozinhos no crime, logo, roubar se torna perigoso e eles decidem bater ponto num trabalho honesto. É o equilíbrio bom.

No outro equilíbrio, os bandidos estão "motivados" para arrepiar e confiantes em que não serão pegos. Para eles, a polícia é como a defesa do Brasil contra a Alemanha no Mineirão. É o equilíbrio ruim.

A questão é: como o mundo seleciona o equilíbrio? Aqui entram vários fatores, inclusive não econômicos.

A História importa. Se ontem o crime não compensou, é provável que não compense hoje e amanhã. Cidades que têm sido seguras tendem a continuar seguras, salvo na ocorrência de algum fato novo que desestabilize o equilíbrio.

Crenças morais também importam. Não somos tão simples quanto o Amoraldo, que busca apenas ganhar mais dinheiro, não importa como. Trazemos nossas visões de mundo, que aprendemos na igreja ou no colo da avó, sobre o que é certo e errado. Os valores da sociedade também importam: onde quem ganha dinheiro honestamente é respeitado, menos vai compensar ser bandido. E se menos Amoraldos decidirem ser bandidos, menos bem-sucedidos eles serão! E sendo menos bem-sucedidos, também os bandidos são mais repulsivos aos valores da sociedade.

Daí o nosso problema. Desde que o Brasil deixou a criminalidade aumentar, os benefícios da ladroagem também aumentaram. Com mais bandidos na rua, o sentimento de impunidade se avulta. Impunes, bandidos bem-sucedidos dirigindo automóveis vistosos e jantando em restaurantes caros corrompem os valores da sociedade.

Voltar para o equilíbrio bom exige, dessa forma, uma grande mudança nas condições. Um pouco mais de policiais na rua ou empregos um pouco melhores na economia honesta não vão ser suficientes.

Precisamos de tudo junto agora: mais policiais para aumentar a probabilidade de cana, penas mais duras para a cana ser mais dolorosa, mudança nos valores da sociedade para que o bandido bem-sucedido se torne um pária e não possa usufruir de seus ganhos e, para completar, uma mudança nas percepções sobre as possibilidade de sucesso de atividade criminosas, para que mesmo um sujeito ruim como o Amoraldo pense duas vezes antes de sair da linha.
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